sábado, 9 de janeiro de 2010

Crônica sobre o quase nada


Sábado com sol e vento. Os sons habituais da vizinhança urbana, das ruas e da mata ao fundo da casa. O de sempre: carros e caminhões, crianças gritando em seus folguedos, bem-te-vis,sabiás, cambachirra, outros que não identifico, nem o som, nem a ave, apenas ouço e me deleito. Cigarras, grilos, sou uma privilegiada na vida. Mesmo os momentos de dor ou angustia, mesmo os grandes desesperos, foram até agora superados e tiveram alguma contrapartida. Deixando sequelas, é claro, algumas imperceptíveis, outras bastante graves, determinantes de quem me torno, com certeza. Pois é assim que venho crescendo, aos solavancos. Ah! não, a imagem que me ocorre não é uma senoidal, não há suavidade nas transições entre os extremos alcançados pela linha traçada, apenas transições súbitas, abismos, penhascos, despenhadeiros. Talvez por isso eu goste tanto de montanhas, espelho-me nelas, metáforas de minha vida. Tanto como Sísifo, as vezes Prometeu, outras, o Eremita; buscando a sabedoria, tentando alcançar Zaratustra, ora apenas uma caminhante. Sinto em suas faldas, as certezas que procuro e sei que não existem, e que se desprendem, rolam, como as rochas sob pés descuidados. Talvez por isso eu não encontre meu lugar, meu lar, não consiga fazer minha casa, me prendo, sem raizes, com gavinhas, e rompo, e sigo, e volto...
Não posso fugir pelas estradas, estou presa... a meu passado, a meus ancestrais, às minhas incertezas. Estou exclusivamente comigo mesma, sem disfarces, sem linhas de fuga, sem rotas de fuga, com linhas de rugas, mas não deveria ser sempre assim? Isso não deveria produzir lágimas ou dor! Tudo é temporário, transitório e, paradoxalmente, permanente e definitivo. O que voce se torna, as pegadas que voce deixa, como a sua historia e marcas deixadas na vida, nos outros, acabam se apagando. Vou me diluindo na imagem que produzo de mim. E quem sabe encontre alguma tranquilidade ou certeza.

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Reinício em 11/02/2011